A primeira edição do Relatório de Atividades para Populações Indígenas da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) , referente a março, aponta que aproximadamente 5 mil refugiados e migrantes indígenas foram registrados em território brasileiro. Desde 2018, o ACNUR registra a entrada no Brasil de indígenas vindos da Venezuela.
Desse total, 3,2 mil são solicitantes da condição de refugiado, ou seja , se enquadram legalmente como indivíduos que deixaram seu país e território forçadamente devido a fundado temor de perseguição ou contínua violação de direitos humanos.
“Para o ACNUR, este indicador é mais um recorte da necessidade de proteção internacional de indígenas venezuelanos”, explicou o Associado de Proteção e Soluções Indígenas do ACNUR no Brasil, Sebastian Roa. “Trata-se de populações que enfrentam diversos desafios em seus territórios , que, ao longo da história , sofreram com intervenções externas . Desse contexto se origina a busca por refúgio em território brasileiro”.
“É nosso papel apoiar a garantia de direitos desta população no Brasil, respeitando a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre populações indígenas , à luz da lei brasileira de refúgio”, completou.
A presença de indígenas venezuelanos no Brasil
A primeira edição do Relatório de Atividades para Populações Indígenas é um mapeamento demográfico. O Representante do ACNUR no Brasil, Jose Egas, explica que o objetivo do relatório “é apresentar ações e boas práticas com foco em proteção e integração local de indígenas venezuelanos, além de servir como material de apoio para formulação de políticas voltadas para essas populações”.
Dividida em quatro etnias – Warao (66%), Pemon (30%), Eñepa (3%) e Kariña (1% ) – a maior parte dos indígenas deslocados está na região Norte. No entanto, muitos deles já estão presentes em 16 diferentes estados do Brasil.
Em relação ao povo Warao, apenas em Roraima são cerca de 1,3 mil indígenas dessa etnia. No Pará são mais de 970 e no Amazonas, 600. O restante dos Warao está dividido entre as demais regiões do Brasil, com boa parcela no Nordeste.
No contexto da pandemia da COVID-19, o ACNUR tomou diversas ações para assegurar a proteção dos povos originários em situação de refúgio e deslocamento.
Em Boa Vista, o abrigo Pintolândia, coordenado pelo ACNUR com gerência da Força Tarefa da Operação Acolhida e da ONG Fraternidade Internacional (FFHI), conta com 538 indígenas abrigados. Muitos deles estavam em situação de rua.
Ainda na capital roraimense, são 413 indígenas morando em ocupação espontânea. Eles recebem apoio do ACNUR, que realiza o monitoramento populacional do local e doação de itens emergenciais. Indígenas que moram nessa situação são ainda mais vulneráveis, enfrentando dificuldades para o acesso à documentação, moradia, saneamento básico, meios de subsistência, entre outros.
Mais ao norte, em Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, são 306 pessoas da etnia Warao compartilhando o abrigo Janokoida, que na língua de seus moradores significa “Grande Casa”. Antes da pandemia da COVID-19, a população era de mais de 500 pessoas. No entanto, com as medidas de prevenção, aproximadamente 180 abrigados foram transferidos para o abrigo Janoko Yakera, “Casa Bonita”.
Já em Manaus, o ACNUR apoiou a estratégia de realocação de 534 pessoas para cinco espaços emergenciais e temporários com melhores condições de higiene e saneamento. A ação contou com apoio da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania (SEMASC) e outras Agências da ONU.
Uma das cidades do Brasil com maior número de venezuelanos indígenas, Belém conta agora com um novo abrigo para garantir a proteção dessa população. O local foi inaugurado com apoio do ACNUR, que disponibilizou apoio técnico, treinamento das equipes em proteção e gestão de abrigos, planejamento de realocação e doação de unidades habitacionais.
“Em âmbito nacional, o ACNUR tem atuado para capacitar autoridades locais e apoiado a criação de comitês estaduais e municipais de proteção dessas pessoas. Buscamos fortalecer capacidades técnicas e discutir planos de ação com foco na população indígena venezuelana refugiada e migrante. É fundamental que atores locais conheçam e integram a resposta a esta população”, explicou o Representante do ACNUR no Brasil.
Doações que salvam vidas
Entre abril e maio, foram distribuídos 4,3 mil itens de assistência emergencial entre os abrigos que acolhem a população indígena refugiada e migrante em Roraima, Amazonas e Pará.
Os itens são kits de limpeza, álcool gel, colchões, redes, lâmpadas solares, unidades habitacionais e mosquiteiros, que têm o objetivo de atender as recomendações internacionais de higiene e as necessidades específicas dessa população no contexto da COVID-19.
Segundo o Representante do ACNUR no Brasil, outra frente de trabalho essencial é o apoio técnico prestado aos gestores públicos e atores humanitários. “O ACNUR capacitou mais de 200 atores da rede municipal, estadual e da sociedade civil em São Paulo e Minas Gerais sobre a população indígena que tem chegado recentemente nestas localidades. Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco também receberam apoio técnico com treinamentos, compartilhamento de informações e apoio a planos locais de reposta emergencial. No Rio de Janeiro e Acre, as ações foram realizadas em parceria com a Organização Internacional para as Migrações (OIM)”.
O Relatório de Atividades para Populações Indígenas do ACNUR traz também o número de mortes registrados no monitoramento realizado pela agência desde 2017. Ao todo são cerca de 80 falecimentos registrados nos últimos três anos, dado fundamental no apoio à resposta das redes locais de proteção. Um levantamento específico de óbitos causados pela COVID-19 está sendo realizado pelo ACNUR.
O ACNUR agradece todos os seus doadores pelas importantes contribuições que permitem a organização continuar trabalhando para oferecer dignidade, proteção e segurança para refugiados e solicitantes de refúgio no Brasil.
Fonte
O post “ACNUR: 65% dos indígenas venezuelanos no Brasil são solicitantes de refúgio” foi publicado em 4th June 2020 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte ONU Brasil